quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Augusta e Mariana

Apesar de estreita como uma artéria, a rua Augusta tem um grande comprimento. Sua amplitude alcança extremos da cidade: do centro velho aos Jardins, do coração abandonado à amante de ocasião, do fino ouro à miséria do mendigo que me implora dez centavos.

À noite, ando pela Augusta e me apaixono pelas miudezas: acontecimentos menores, minúsculos, que causam aqui, em mim, explosões da alma. São pequenas frações do minuto...menos, menos: ínfimos segundos que revelam o sabor imensurável da condição humana.

Em um bar, por exemplo, dois homens jogam bilhar. Estão contentes por se acharem ali, alcoolizados de liberdade, e não juntos às esposas, que dormem em casa, provavelmente. Os dois homens riem, alegres, como se esse fosse o último riso – uma bola caída no buraco, um objeto-sentimento que nunca mais voltará à mesa.

Mais acima, na esquina, duas garotas dormem escoradas em uma porta de ferro. Estão ancorada uma à outra: assim se sentem seguras, imagino. Seus rostos transmitem serenidade, transcendência ou, talvez, uma bebedeira. Para elas, descansar em uma rua de perigos não significa nada, pois uma tem a outra, eternamente enquanto durar o sono.

Um amigo meu, o Renato, também está por aqui, na Augusta. Ele sobe a rua em direção à Paulista. Anda rápido, e parece fugir de algo. Está acompanhado da namorada, a Érica. Enquanto caminham, os dois discutem: ela grita, ele grita, ela chora, ele vira as costas, ela chora mais, ele retorna, eles se beijam e se amam novamente. O amor é claustrofóbico, sinto.

Mais alguns passos me levam a um grupo de pessoas. Nada melhor que estranhos para eu me descobrir melhor, penso. Com desconhecidos, atinjo o maior nível de sinceridade. Os estranhos são três garotas e um casal, que, como todo casal, não enxerga o resto do mundo.

Uma das garotas vomita o álcool da noite. Patrícia é o seu nome. Tento consolá-la com palavras doces, mas a bebida é mais amarga. Grito, pois ela está no outro mundo e não me ouve. Depois de jogar fora as impurezas, a Patrícia encosta a cabeça nos meus ombros e dorme o sono dos bons.

A outra garota se chama Bruna. É morena, alta e alegre. Fala bastante, talvez por ter bastante a falar. Parece-me meio inquieta, cheia de vontade de ir embora. Mas, de repente, ela me surpreende: quer beber mais uma tequila! Com o desânimo dos outros, ela desiste. Toca o telefone: é a sua mãe.

Por último, a Mariana, que deveria ser a primeira, pois foi com ela que puxei conversa. A Mariana tem um sorriso lindo, encantador...Seus cabelos, castanhos, voam com o vento forte da Augusta. Ela fala rápido e meio enrolado (ou talvez meus ouvidos que sejam lerdos demais). Me chama de amigo, como se nos conhecêssemos há alguns anos.

Peço dois reais emprestados pra ela, pois perdi o meu dinheiro e os meus amigos, que já foram embora. Preciso pagar a passagem de volta. Ela procura nos bolsos duas moedas de um real. “Muito obrigado”, digo.

No alto de um prédio um relógio marca cinco da manhã. Penso na noite: quantas coisas, situações, pessoas! Que demais. Mas vou embora, tudo bem? Até mais! Eu ficaria por aqui, sim, para sempre sentado na calçada...eterno enquanto durar o meu encanto: eu, a Augusta e a Mariana.

3 comentários:

Bruna Correia disse...

Caramba, eu e as minha amigas fomos para num blog...sauhushauhsuahs meu o que a Augusta ñ faz em nossas vidas hein. Amei o texto =)
Beijo

Nath disse...

"...um casal, que, como todo casal, não enxerga o resto do mundo."

concordo plenamente! :)

Web Pick up disse...

Esse TCC na Augusta to vendo que vai render demais, com certeza é um lugar cheio de peculiaridades, quero ver o resultado final do seu livro.

Adhemar Juan