terça-feira, 18 de agosto de 2009

O céu de Amaury

Em um dia funesto, a Morte chegou a uma conclusão tão catastrófica quanto uma queda de avião: “na vida, há coisas piores que a morte”, constatou. Então, a misteriosa figura foi visitar o aposentado Amaury Guedes, 74 anos não por vontade própria, mas porque quis assim o Destino. A Morte gostou de Amaury Guedes e, como não podia dar-lhe de presente o cargo, lhe entregou o uniforme preto.

Desde então, esse homem de fala mansa persegue a vida em protestos pelo país. Foi no acidente da TAM, no buraco do metrô, na Parada gay: onde tiver um aglomerado de insatisfeitos, lá estará Amaury e a sua fantasia de morte. Talvez ele seja a pessoa que mais foi à manifestações no planeta, mas o livro dos recordes ainda não se interessou por essa marca. “Eu fico lá sentado no muro, apareço na TV, tiro fotos”, diz, com a determinação e o Bilhete Único pendurados no pescoço. Ele reivindica o fim da diminuição progressiva de sua aposentadoria especial. “Minha aposentadoria é como gelo: derrete cada vez mais”, lamenta.

Amaury Guedes percebeu o tamanho da injustiça do mundo quando teve de comprar moela e asa de galinha no lugar do filé mignon. Com a aposentadoria que tem hoje, a vida de antigamente não pode mais ser desfrutada. “Nos fins de semana, eu ia para Recife, Porto Alegre. Hoje não faço mais isso”, compara.

Esse autêntico brasileiro tem três filhos e é casado, mas tornou-se viúvo da antiga maior companhia aérea brasileira quando o governo do presidente Lula decidiu fechá-la. Hoje vive no exílio de sua própria vida, faz as contas de uma proporção inversa: poderia receber sete mil reais, mas ganha apenas R$ 1.500. Os remédios aumentaram (gasta aproximadamente 300 reais por mês com eles) e a qualidade de vida diminuiu. “Eu sou pura tristeza”, diz.

O céu das viagens que Amaury fazia como comissário da Varig é muito menor do que a sua esperança. Por isso ele luta, protesta, se veste de palhaço e de morte, viaja à Brasília para convencer senadores a ajudá-lo a retomar o dinheiro que perdeu. Recentemente, descobriu outro avião: a internet. Aprendeu que pode voar sem sair de casa, basta apenas apertar o botão de ligar o computador e postar seus textos. A única coisa que Amaury não entende é o por quê de ter perdido a pensão especial pela qual contribuiu durante 30 anos. Essa é a sua injustiça e também a sua busca: quer viver melhor, pois trabalhou para isso.

Em uma pasta de plástico, Amaury Guedes guarda as suas histórias. Orgulha-se de ter fotos e perfis sobre si publicados nos principais jornais e revistas do Brasil. São folhas e Folhas que contam a sua saga em busca de seus direitos. Amaury não desiste! É isso o que o torna tão singular, mas tão parecidos com os milhões e milhões de brasileiros que, como ele, lutam a cada dia por seu pedaço de pão (e de vida).

Não estamos em 1984 de George Orwell, mas Amaury Guedes é vítima de uma grande máquina de esquecimento coletivo. Ele e todos nós enfrentamos a gigante e impiedosa indústria que faz com que nós, jovens de idade, esqueçamos os rostos de quem ajudou na construção do Brasil. Eles, os aposentados, colocaram as peças, fizeram o motor, testaram e, no caso de Amaury, colocaram o país para voar. Cabe a nós manter o avião sem turbulências e não esquecer daqueles que ficaram no chão.

Se Amaury encontrasse a Morte novamente, com certeza ela não iria querer o seu uniforme de volta.

11 comentários:

Leandro disse...

Antes de alguém perguntar, o Amaury existe de verdade!
Quem quiser acompanhar a saga deste brasileiro, pode procurá-lo no Twiter ou no Youtube. Ou, se você tiver sorte, em um protesto pelo Brasil: ele estará lá, pode ter certeza.

Abraços.

Gleyci Pamplona disse...

AAAAAAAAA eu me pergunatva, quem é Amaury? Hum será que ele esteve por aqui por belém, na epoca do Forum Socila Mundial? serpa que ele esteve no protesta afvir da legalização da da Erva?

Gleyci Pamplona disse...

Forma correto do coment. acima:
Será que amaury esteve por Belém na epoca do Forum Soc. Mundial e andou pela marcha afavor da legalização da erva? ou será que ele ando peladão na marcha da galera naturalista?
Abraços...

Denize Guedes disse...

Oi, Leandro.
Seu blog é bem legal, parabéns! E gostei da frase do João Gilberto Noll.
Então, vou passar o link do texto pro meu pai, ficou muito bonito.
Beijos,
Denize

Incrédulo disse...

Oi Leandro,
estou lisongeado e agradecido pelo
texto postado no teu Bog.

Incrédulo disse...

Oi Leandro,
corrigindo, estou lisonjeado e agradecido pelo texto postado no teu Blog. É a idade! Um abraço fraterno, Amaury

Anônimo disse...

Parabéns Leandro, belíssimo texto sobre o Sr Amaury. Um grande guerreiro, que luta pelos seus direitos como cidadão de um país tão injusto com os aposentados que ajudaram a construir um Brasil melhor.Parabéns.

Cleia carvalho disse...

Esqueci de colocar o meu URL
www.cleiacarvalho.nafoto.net

TANIA disse...

Leandro.
Amaury merece mesmo todas essas homenagens, tanto no seu blog quanto no da Denize.
Ele é um grande lutador pela nossa causa (velhinhos aposentados).
É digno de nossa admiração, e exemplo para os mais novos.

Unknown disse...

Parabéns Leandro, belo Blog!
Abraço

Daniele Aoki disse...

Oi Le
Seus textos estão cada vez mais gostosos de ler...
Adorei a forma que vc contou a história do senhor Amaury...