Para um derrotado contumaz, os livros de auto-ajuda fazem todo o sentido. Os autores dessas obras se aproveitam da nossa ingenuidade em acreditar que, amanhã ou em algum momento no futuro, as coisas vão dar certo. Se fracassamos ontem e hoje, alguma força do universo (ou em nós mesmos) nos fará vencer amanhã. É uma questão de tempo e de paciência.
O torcedor de futebol é, antes de tudo, um grande apaixonado pelo fracasso. Ninguém convive tão bem com a frustração e com a derrota como um bom torcedor de futebol. Mesmo chutada pra longe por um atacante caneludo, a esperança da vitória nunca abandona o estádio; ela sempre está ali, renascendo a cada apito inicial do juiz. Ouso dizer que são as derrotas (e não as vitórias) que fazem aumentar o amor por um clube.
Para mim, a maior derrota do meu time aconteceu há mais 10 anos, em julho de 2000. Eu não passava de um pivete metido a besta. Entendia tudo de futebol: das formações táticas, dos tipos de chuteira, da história gloriosa e dos ídolos que eu só conhecia pelos pôsteres colados na parede da sala.
O jogo era entre São Paulo e Cruzeiro pela final da Copa do Brasil. A partida seria difícil, pois era fora de casa e o tricolor tinha empatado o primeiro duelo, no estádio do Morumbi. Para sermos campeões, precisávamos ganhar ou empatar por 1x1.
Antes de começar o jogo, o meu vizinho, um autêntico corintiano, me provocou. Não se sabe como, ele conseguiu uma enorme bandeira do Cruzeiro e a colocou em sua janela, que, infelizmente, dá de frente para a minha. Segundo meu vizinho, o Cruzeiro ganharia fácil. Ele quis até apostar, mas, como sempre achei que essa coisa de aposta sempre dá azar, não aceitei.
Minha mãe era outra que aderiu a causa celeste. Ela é mineira e, por isso, resolveu que o Cruzeiro merecia o seu apoio. É de se indignar, né? Como uma mãe abandona o filho numa situação dessas para dar lugar ao bairrismo do pão de queijo? Na minha casa, eu estava sozinho.
O primeiro tempo terminou zerado. O jogo estava truncado, pra não dizer feio. Fiquei nervoso, como era de se esperar. Durante intervalo fui tomar um banho, somo sempre faço, para esfriar a ansiedade. Não há nada mais chato que intervalo de jogo de futebol.
No segundo tempo, o São Paulo marcou um bonito gol de falta. Comemorei como um louco: subi no parapeito da janela e comecei a xingar toda a árvore genealógica do meu vizinho corintiano. Seríamos campeões, cara! Faltavam 10 minutos para o final do jogo e o Cruzeiro precisava virar. O empate era nosso.
Aos 36, o time azul empatou e a luz amarela se acendeu entre os torcedores do São Paulo. Mesmo assim, precisávamos apenas segurar mais alguns minutos e seríamos campeões.
Aos 43, o Cruzeiro conseguiu uma falta perigosíssima na entrada da área. Se você for torcedor fanático de algum time, conhece aquele pressentimento que bate segundos antes da coisa ir pro limbo. Por algum acaso do universo, nós sabemos que a vaca vai pro brejo antes mesmo do primeiro passo. Foi isso que senti nos segundos que antecederam aquela falta.
O jogador do Cruzeiro chutou. A bola nem foi tão forte assim, mas desviou na barreira e entrou no canto direito do goleiro. Pronto, o mundo acabou ali, fiquei péssimo. O fracasso do time é sempre mais nosso que dos jogadores, né? Na vitória, comemoramos em grupo; a derrota é individual. Naquele dia, principal derrotado era eu.
Meu vizinho apareceu na janela, gritando como um porco. Minha mãe mandou a frase de consolação, algo como “na próxima vocês ganham”. Sim, a gente sempre espera pela próxima.
A esperança continua em campo.